domingo, 26 de novembro de 2017

meteoros

meteoros atingem a Terra todos os dias
como mariposas que ousam entrar no abajur
seduzidas pela luz, pelo calor

meteoros no entanto
adentam a atmosfera terrestre
para se esfriar, já que eles são consciências
ardentes em busca de tranquilidade

meteoros rasgam o céu sem pena
dilacerando nuvens brancas que sonham em ser chuva
amanhã

meteoros surgem na noite da Sibéria
e encantam um menino pastor
que sonha sem precisar da internet

meteoros buscam o conforto
da terra fria de nosso planeta
que  os ajudam a encontrar equilíbrio

meteoros não servem para nada
caem na terra, fazem estrondo
e iluminam inutilmente as noites mais silenciosas

meteoros só servem talvez
para mim
que queria escrever um poema sem saber sobre o quê

meteoros são as palavras no cérebro de um poeta
que sonha em ser lúcido em um tempo sem lucidez
que se diverte imitando  Rimbaud, Lorca e Pessoa,
meteoros que também caíram na Terra. 

NAVEGANDO



para ti.


navegando, navegando
mar à frente
enquanto pelo meu corpo
o sabonete de camomila faz um desenho de espuma
e a luz do basculante é o sol gigante
de novembro
a anunciar o verão rompante
e espetacular de todos os seres


navegando, navegando
uma garça à beira-mar
poisada contempladora do futuro
a sonhar o amanhã luminoso
em que teus dedos
brinquem a desenhar nuvens
nas ondas do mar
que são as espumas a escorrer com delicadeza
por minhas costas

navegando, navegando
para casa
para dentro
cruzando os céus
como pássaros migratórios
que não se perdem

navegando, navegando
dentro de nós mesmos
dos nossos olhos aquosos
que são oceanos de luz e vida
onde vivem as mais belas
medusas do pacífico

navegando, navegando
para uma manhã de abril
nossa cama e nossos lençóis
brancos
como a paz mais profunda
e verdeira que nos pode assaltar

navegando, navegando
enfim nossos pés que se encontram
e se roçam
desenhando um coração
a forma dum antigo lago de sal
invadido pelo derretimento
criativo das geleiras e refeito
de mar e amar

não há mal que não traga um bem
não há barco ou garça que não encontre
um porto, um cais, o sol.

C. Berndt
26/11/2017

domingo, 19 de novembro de 2017

Dar-te-ei (Jeneci)


Não te darei flores, não te darei, elas murcham, elas morrem
Não te darei presentes, não te darei, pois envelhecem e se desbotam
Não te darei bombons, não te darei, eles acabam, eles derretem
Não te darei festas, não te darei, elas terminam, elas choram, elas se vão

Dar-te-ei finalmente os beijos meus
Deixarei que esses lábios sejam meus, sejam teus
Esses embalam, esses secam, mas esses ficam
(...)



sexta-feira, 10 de novembro de 2017

SOL E NETUNO

disse-me a astróloga de voz doce
e suave
que nesta semana há um encontro fluente
entre o Sol e o planeta Netuno
ou seja
anuncia-se
soturno
verdadeiro convite no céu
para exercícios aquáticos de autognose
livre e demorada navegação
mergulhos convictos nas profundezas
mais fundas do nosso espírito
e lá
no que há de caos e de sossego
aprender algo sobre nós mesmos
sobre o mar que somos
e o amar de que tanto precisamos


e desse mar de Adasmatores
de movimentos involuntários, dores e amores
saibamos então ser o timoneiro
que flutua lúcido
que atravessa o bojador
com calma e paciência
e sabe a hora exata de regressar e de chegar
à esta finisterra
América fugaz e etérea
interno, individual e fecundo
Novo Mundo

quando voltares à superfície
os raios agressivos dos olhos de Apolo
iluminarão teu rosto
e o corpo de Netuno
agora redescoberto (por ti)
tomará finalmente tua mente
rompendo todo o azul placentário:
já podes flutuar sobre as águas como Cristo
a mão que te toca é a de João Batista

ninguém pode ir ao céu se não
nascer de novo
da água e do espírito.

C. Berndt
30/10/2017