sexta-feira, 23 de junho de 2023

uma primavera de saudades








para você, meu baby.  


uma flor é um corpo
e um corpo pode ser

sim

uma flor

desde aquele tempo
eu sempre cultivo em mim
a lembrança do teu lírio-corpo

e não sou capaz de fazer cair
fogo
nestas raízes de flor que plantaste
sem muito cuidado
em meu breve corpo

todas as manhãs
eu dou de beber à terra da lembrança
rego a tua face de hortência
aliso os teus dedos de pétalas
cuido
de um jardim inteiro
de saudades
e lembranças-sem-vergonha

um corpo
pode ser, sim
muitas coisas

mas o teu corpo
tuas nádegas-jasmins
teus cabelos e teus pêlos
pretos e enrolados
como cipós
crescem em torno de mim

e não me sufocam
nem me deixam cansado
são névoa
e são flores
de laranjeira
nos meus dias todos

em que bebo chá
piso a vida
cresço
e não me esqueço

um corpo

(o teu)

pode ser

sim

uma flor

uma primavera inteira de saudades. 

borboleta amarela
























nesta manhã
quando tudo era névoa e perda
uma borboleta
pousou
na minha omoplata esquerda

sim, uma borboleta amarela
daquelas de jardim
de quando o tempo é morno
e as nuvens flutuam em torvelinho

e onde antes havia uma cratera
uma ferida exposta
sangue coalhado 
lágrima e dor
nasceu uma flor

e a borboleta talvez retorne amanhã
ou outro dia 

já que foi ela
alma de aquarela
que trouxera
em suas asas
a cura
o pólen
a seiva
a semente 
ou o esperma

a fantasia

que fez renascer em mim a alegria

e me despertou de toda afasia.