quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014

A FACE DE DEUS

Olhar a face de quem se ama é como olhar a face de Deus
- e diria eu na mais sincera heresia: a face de quem se ama é a face de Deus.

Ainda que somente aos nossos olhos,
o amor - o nosso amor - é sempre o maior
e o mais bonito e o mais perfeito dos amores imperfeitos
- amar nunca é suficiente e não existe sob as estrelas do firmamento
 um único  amor que seja isso: perfeito.
Mas ainda assim,
ele me parece lindo,
embora eu saiba o calvário que cruzei
e a cruz na qual serei pregado no fim do caminho
 - como deus foi.
Deus tolo e impotente pregado por Amor!
Valeu a pena dar o sangue por amor?

Amar é sempre pouco e impossível,
o outro nunca está dentro da gente,
nunca nos pertence e nem esquece de si
porque nos ama, ou diz amar.
A dúvida aqui - a minha inconsolável dúvida-
é a seguinte: o que é o amor?
Não seria ele apenas uma doce e ilusória criação?
Um sonho?
Um poema sonhado mas nunca encontrado?
Uma ideia-pensamento? Nuvem de poeira?
Tempestade?
Ou seria medo da morte?
Pior: medo da morte e da solidão.
Seria, então, somente medo?
Ecos-fantasmas e egoísmo?

Não sei, não sei, não sei.

Sei
que sou já um vaso transbordante de dúvidas,
um cálice rachado, por onde fogem o sangue - os versos.

Ai, dúvidas ensopadas, salgadas... que não me deixam dormir!
Não durmo! E vocês?
O amor,
as ideias, o sonho e as vontades vos deixam dormir?
Não há  camomila que me dê jeito
nem lua nem canção que abrande o pensamento...
Nem verso puro que me mate,
que me enlouqueça por completo,
que me encha de esquecimento!

Sou eu só uma Saudade que morre e morde. Morde.
Morde-me de raiva, de vontade, de querer e não querer,
de achar belo o que no instante seguinte amaldiçoo.
Ai de mim! Ai do meu amor e dos meus sonhos!
Ai de todos esses fantasmas e lembranças!
Ai de Narciso e desta face!
Esta face... esta face... a mais linda e encantadora face.
Daria toda a minha poesia se pudesse tê-la novamente,
olhando-me deitado no travesseiro,
procurando-me nos olhos...
Isso é só vontade?
Orgulho pela perda?
Ou é isso que chamam de Amor?
Amor?
Amor... Volta. Ainda que miragem,
volta.

*

- Não, não é amor. É só o vento lá fora.
Suspiro aliviado, mas ainda perturbado:
que amor,
que amor é esse que não me deixa?
Solto os meus olhos no infinito escuro
 e vejo estrelas cintilantes
que só me cantam torturas, fados... nem elas, nem elas
são tão belas quanto a face daquele que Amei.

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